Os
sentimentos são confusos. Não é possível distinguir o que faz parte do
transtorno e o que faz parte da vida, distinguir o real do imaginário. É uma
batalha de perguntas internas e sem respostas, é preciso do outro para que se
consiga ver o discernimento. Mas não há outro, so você mesmo.
Esse
emaranhado de sensações se resume em uma palavra: frustração. Tem pessoas que
tem domínio sobre seus sentimentos, chegam a parecer frios, tudo superam. Sei
que eu não sou assim, não tenho essa equilibrio e fico por dias e dias
degustando aquele sentimento. Mas sei como ela passa – palavras. Quando consigo
me expressar, extravasar o que esta dentro de mim e ver pelos olhos do outro
aquela situação que desencadeou tudo, é como se meu corpo se transpusesse e
tudo passa a fazer sentido e, assim, tenho de volta a estabilidade.
Ele
(singular). Tem extrema relevância na minha vida. Relevancia em grau hard. É o
possuidor de todas as minhas emoções, o que tem total domínio de me deixar em
êxtase ou em violência, em graça ou em melancolia. Mas quem deu esse poder?
Minhas expectativas, com certeza. Malditas expectativas, e elas planam na
estratosfera.
Já pensei em
codependencia. Minha vida gira em torno dele, tudo que faço, tudo que penso,
tudo que planejo. Seria falta de amor próprio? Acho que não. Descartei essa
hipótese. Sou extremamente independente.
Então seria
egoísmo. Ah, isso conheço bem. Ele é o auge do egoísmo. Mas no meu caso é um
egoísmo atípico, não posso nivelar. Eu quero tudo em intensidade, e essa
potencia não se acomoda somente dentro de mim, precisa ser compartilhada. Acabo
sobrepondo à ele essa reserva.
E também tem
o trágico egocentrismo. E para que o mundo, se não é para que ele gire ao meu
entorno? Afinal é o meu mundo! Mas em um relacionamento, quem entra no mundo de
quem? como comportar esses dois mundos em um só? Vou ter que retomar a
frustração. Meu prazer esta em dar prazer. Será que me sinto tão áureo e
pujante, invejando (ou admirando) a magnificência de Deus, que minha busca está
em ser o garantidor da felicidade dele? Não é tão divino assim. Eu quero
proporcionar a plenitude, mas isso não sai de graça. Logo, é luciferiano.
Espero a recompensa, com uma palavra, um gesto, um olhar. E nem sempre fico
saciado, espero que tenha mesma atitude comigo. Mas aí já em um paradoxo
psíquico. Algo que eu exijo mas não quero. Gosto de dar, isso me satisfaz. Não
gosto que façam por mim. Gosto, acho, mas não tem a mesma paridade de força. A
falta de carinho me incomoda, a falta de atenção me angustia, mas o excesso repugna.
Entao por
que dar algo que não foi pedido? Isso até sufoca. Vou ter que retomar o
egoísmo. Mas daqui um pouco.
Preciso
desenredar o que me trouxe incômodo. Sim, o fato de se referir à ex. Questiono
por que falou sobre aquilo, questiono a quantidade de vezes que vamos pra cama,
questiono a idade, a andropausa, o tesao por mim, o tesao por outras, a rotina,
a mesma fenda. Mas também questiono a postura e a falta de amparo e
envolvimento com a minha dor. Questiono a negação ao meu clamor. E, novamente, surge
a frustração, ou decepção, não sei a diferença entre elas. Eu esperava
compreensão e um pedido de desculpas, esperava exprimir o que estava me
asfixiando, e não tive nada disso. Não sei, como sempre acontece, se estou
certa. Nem todos lidam com os problemas da mesma forma que eu. Ele tem um
sistema de simplesmente deixar para o universo, tudo passa num copo e numa tela,
e, pronto, quando abriu os olhos, esta tudo resolvido. Não posso exigir que
tenha o mesmo meu comportamento. Mas por que so eu devo entender a atender?
Essa submissão não me machuca mas me torna displicente. E isso acaba comigo,
porque devo estar sempre imersa, o raso eu repudio.
E do nada,
tudo perde o sentido. Acaba o encanto pelo nascer do dia, por uma musica que
mexe com a gente, pela estrada, por um bom sexo, por uma compra ou se perder
por instantes em um livro. Tanto faz. Qualquer coisa, tanto faz. Tudo fica
morno, fraco, tedioso. Domino isso, é a chegada da depressão. Minha vida fica
mergulhada na insensibilidade e na indiferença.
Ou não é
depressão. É só um ato de renuncia. Será que disputo por algo sem propósito?
Não me refiro ao amor, desse tenho convicção. Me refiro a lutar por algo que
não exige isso, como buscar a virtuosidade de algo que já é virtuoso. Por vezes
exaurem-se as queixas, e mais uma vez questiono se elas fazem sentido. Pra mim
fazem, naquele momento. No minuto seguinte, já se esvaiu.
E do nada,
tudo ganha sentido. Volta o brilho, a leveza, a intensidade, o desejo, a vida.
Parece que nada aconteceu, aquele entorpecimento que oxidava lenta e
profundamente é como se nunca tivesse existido. Esse é o grande duelo do
bipolar, as emoções são sempre vividas no seu ímpeto, sentimos em overdoses.
As vezes da
vontade de entregar um manual pra ele pois seria tao fácil lidar comigo usando
apenas o interesse e algumas poucas palavras. Mas imagina um manual de 1000
paginas em mandarim! Confesso, não sou fácil. Tem varias pessoas dentro de mim,
cada uma quer algo, um pouco de tudo, em tempos diversos, sem sintonia.